(...) um exemplo contemporâneo é a contaminação cruzada da língua amorosa com a língua amistosa ou social. Chama-se "meu amor" aos cabeleireiros. "Despacha-te, meu amor, que eu estou super atrasada". Quando "meu amor" é para toda a gente, todas as palavras do vocabulário amoroso são despromovidas. "Querido" já se usa como palavra agressiva: "Ó meu querido amigo, se você não tira já daí o carro...". Na Inglaterra, love you! já se usa mecanicamente ao telefone, para indicar o fim de uma conversa. Em Portugal, ainda não chegámos a esse ponto, mas já se diz "amo-te" com grande ligeireza, no sentido de "obrigado!" ou "fizeste exactamente o que eu queria obrigada!". Diante esta apropriação, o amorês é obrigado a carregar-se de bagagens suplementares. Se "amo-te" não quer dizer nada, é preciso acrescentar: "Amo-te. Mas é a sério. É amor mesmo; amor verdadeiro". O que estraga tudo, claro.
Miguel Esteves Cardoso, na edição de segunda-feira do "Público".
1 comentário:
Sempre cheio de razao o MEC.
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